quinta-feira, abril 05, 2007

Uma lenda sobre a Páscoa

Com votos de Páscoa Feliz para todos, aí vai uma lenda que recolhi vao para cerca de 50 anos.


Há muitos, muitos anos, ainda os romanos dominavam a Península Ibérica, havia um povo castrejo que habitava, mais ou menos, junto ao que é hoje a aldeia de Carvalhais, no concelho de S. Pedro do Sul (talvez Castro da Cárcoda) e que, nesse ano, vivia muito preocupado, porque tudo andava mal com a seca e as moléstias que o assolavam.

As culturas não produziam como de costume; os frutos silvestres não eram o que deviam ser; pois a chuva fora escassa e o sereno, no tempo da floração, não soprara para limpar as pétalas desnecessárias; os animais morriam à sede e à míngua. Era, enfim, um ror de calamidades que a todos afligia.

Os homens, exauridos de mourejar a gleba madrasta, caíam em desânimo, juntando-se à entrada dos seus cardenhos arredondados, conversavam lamentando-se da desgraça em que se encontravam.

Dois varões, de barba negra e hirsuta, rostos tisnados pelo sol e pelo suor, mastigando, lentamente, um naco de pão de castanha e bolota, diziam desesperadamente um para o outro:

- A continuar assim, morremos todos. As minhas provisões não duram mais que três dias. Não sei que hei-de fazer!...

- O teu queixume é bem melhor que o meu, pois já há dois dias que os meus se foram. Vale-nos a solidariedade dos vizinhos.

- O Feiticeiro bem se farta de fazer coisas para ver se a água cai do céu, mas nada. Tudo em vão.

E as práticas eram todas iguais, uma desesperada lenga-lenga de queixumes, até que, cansados, iam por aqueles penhascos resmungando imprecações contra os deuses tutelares do Castro.

Mais um dia ou dois passaram. Uma bela noite de sono, estranhamente, pesado, algo aconteceu sem ninguém dar por isso.

De manhã, ao sair das casas, o povo abriu a boca de pasmo e encanto: a Natureza mudara. As ervas vicejavam, as flores enchiam os olhos de cor e alegria, as cerejeiras, precocemente, reverberavam frutos carnudos e suculentos e os animais, já saciados, viam a água transbordar dos charcos e rumorejar pelos regatos e ribeiros da região.

É que – diz a velha lenda – lá longe, em Israel, naquela manhã primaveril, Jesus Cristo ressuscitara para salvar os homens da Terra inteira.

(Do meu livro já publicado:”Dente de Cavalo”)


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