Qualquer dia hei-de morrer. Toda a gente morre. Serei enterrado em campa rasa como é de minha vontade. Talvez façam bonitos e inflamados discursos fúnebres e até talvez batam palmas, muitas palmas, quando o féretro sair da casa mortuária. Depois, depois será o silêncio, o deixar de falar e, por fim, o esquecimento. Ou será o inverso? O póstumo reconhecimento do valor do artista e do homem que foi a enterrar, com a edição ou reedição de seus trabalhos e com homenagens a tudo e por tudo? Não sei! O que sei e não tenho dúvidas nenhumas sobre isso, é que é triste e lamentável só depois de uma pessoa ter desaparecido da face da Terra, ser5 reconhecido o seu mérito. Só quando o artista desaparece de cena é que é bom? Como pode ele viver, gozar, e agradecer se já não existe?
O meu grande amigo Dr. Júlio Cruz disse-me um dia: «tu já não morres. O teu nome consta no livro de registo da Biblioteca Nacional, encontrei-o lá, quando fazia uma pesquisa. Na altura, confesso, foi um lenitivo e um incentivo não só para os meus desânimos, mas também para que não desistisse nunca de botar ao papel o que me vai na alma.
Hoje; se calhar porque envelheci e; naturalmente; creio-o, amadureci, penso de forma bem diversa. Não são as flores sobre a campa que vão fazer bem ao morto. O que é bom é que, em vida, se lhe dêem essas flores; se lhe façam as homenagens, se cuide devidamente do seu bem-estar físico, mental e espiritual. Que importará, a Camões «lá no assento etéreo onde subiu» todas as homenagens que lhe são prestadas (elas são boas e precisas como sublime exemplo a seguir no presente e no futuro) quando, infeliz e imperdoavelmente em vida passou fome e tanto sofreu?...
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